segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

RESIDENT EVIL 5

O último que joguei foi o 3. Deu até uma emoção vendo os trailers.



Esse é melhor



E uma palhinha do jogo em si



Para XBox360 e Playstation 3.

domingo, 7 de dezembro de 2008

GRAMPÁ NO CONSTANTINE

Confesso que quando li a notícia noTrabalho Sujo, achei que ia ser, pelo menos, um arco. Me empolguei, reconheço. Mas tá valendo.

O lance é que o Rafael Grampá, artista foderoso, vai desenhar uma hq do nosso bom e velho John Constantine para a edição comemorativa a ser lançada ainda esse mês.

Se liga na qualidade.



Há ainda uma outra página no blog do homem. Eu já gostei mais do Azzarello antes do que gosto hoje, mas só pelo fato dele ter se dado ao trabalho de enfiar um demônio numa história do Constantine, já fiquei curioso. Como diz a molecada por aí, vou cofrar.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

LIBRA, UM ESBOÇO

Já falei de LIBRA por aqui, antes. E esse post é particularmente esclarecedor.

Se você está com preguiça de ler velharia, recapitulo:

A idéia surgiu em 2005. LIBRA seria uma série de pequenas hqs de oito páginas, com histórias auto-contidas mas interligadas. Escrevi três roteiros (que hoje acho constrangedores), esbocei mais uns, e fiz o outline da série. Os roteiros passaram pelas mãos de três desenhistas, sendo que um deles chegou a fazer uns model sheets dos personagens e esboçar as primeiras páginas do primeiro capítulo. Como tudo em minha vida que envolve a feitura de quadrinhos - com raras exceções - não dá certo, o projeto acabou engavetado.

Depois, num arroubo de empolgação, decidi espremer tudo num roteiro de cinema para um filme de uma hora e meia. Escrevi trinta páginas. Então me dei conta de que, se para (não) produzir uma hq de oito páginas já tinha sido um verdadeiro parto, o que dizer de um filme. Engavetei.

O problema era que a história falava alto. Ficava cochichando nos meus ouvidos. Não me deixava dormir. Não me deixava em paz.

E só havia uma maneira, a meu alcance, de dar vazão a isso: a prosa. Mais uma vez, tentei dar sequência na história de Ramiro, Matilda e companhia. Juntei todo o material e comecei a castigar as teclinhas pretas. Saiu um capítulo. Depois outro. E parou. Por motivos que não vêm ao caso, deixei o material de lado.

Mas é aquela história. Recentemente a coceira recomeçou e me vi pensando em lugares, cenas, personagens, etc et al.

Decidi TENTAR (notem a caixa-alta) escrever um capítulo disso por mês. Para um wannabe normal, acho que não seria tão difícil assim desovar umas três mil palavras a cada trinta dias. Mas, para mim...

Obviamente, esse trabalho vai correr em paralelo com as outras coisas que pretendo publicar (com uma periodicidade menor) no TXT.

A idéia não é postar a história, capítulo a capítulo, mas dar ao leitor um vislumbre da coisa toda. Um capítulo aqui. Um perfil de personagem ali. Um excerto acolá. Uma idéia sendo considerada. Uma notícia. Uma notinha. Um link. Sei lá.

Enfim, um, com o perdão do trocadilho, livro aberto (pero no mucho).

LÍNGUAS MORTAS, o primeiro capítulo, está repleto de erros e incongruências. Mas é um esboço , um rascunho, e até o fim da história, muita coisa pode e deve mudar. Como sempre, conto com a opinião de vocês.

LIBRA, UM ESBOÇO

Já falei de LIBRA por aqui, antes. E esse post é particularmente esclarecedor.

Se você está com preguiça de ler velharia, recapitulo:

A idéia surgiu em 2005. LIBRA seria uma série de pequenas hqs de oito páginas, com histórias auto-contidas mas interligadas. Escrevi três roteiros (que hoje acho constrangedores), esbocei mais uns, e fiz o outline da série. Os roteiros passaram pelas mãos de três desenhistas, sendo que um deles chegou a fazer uns model sheets dos personagens e esboçar as primeiras páginas do primeiro capítulo. Como tudo em minha vida que envolve a feitura de quadrinhos - com raras exceções - não dá certo, o projeto acabou engavetado.

Depois, num arroubo de empolgação, decidi espremer tudo num roteiro de cinema para um filme de uma hora e meia. Escrevi trinta páginas. Então me dei conta de que, se para (não) produzir uma hq de oito páginas já tinha sido um verdadeiro parto, o que dizer de um filme. Engavetei.

O problema era que a história falava alto. Ficava cochichando nos meus ouvidos. Não me deixava dormir. Não me deixava em paz.

E só havia uma maneira, a meu alcance, de dar vazão a isso: a prosa. Mais uma vez, tentei dar sequência na história de Ramiro, Matilda e companhia. Juntei todo o material e comecei a castigar as teclinhas pretas. Saiu um capítulo. Depois outro. E parou. Por motivos que não vêm ao caso, deixei o material de lado.

Mas é aquela história. Recentemente a coceira recomeçou e me vi pensando em lugares, cenas, personagens, etc et al.

Decidi TENTAR (notem a caixa-alta), a partir do ano que vem, escrever um capítulo disso por mês. Para um wannabe normal, acho que não seria tão difícil assim desovar umas três mil palavras a cada trinta dias. Mas, para mim...

Obviamente, esse trabalho vai correr em paralelo com as outras coisas que pretendo publicar (com uma periodicidade menor) no TXT.

A idéia não é postar a história, capítulo a capítulo, mas dar ao leitor um vislumbre da coisa toda. Um capítulo aqui. Um perfil de personagem ali. Um excerto acolá. Uma idéia sendo considerada. Uma notícia. Uma notinha. Um comentário. Um link. Sei lá.

Enfim um, com o perdão do trocadilho, livro aberto (pero no mucho).

LÍNGUAS MORTAS, o primeiro capítulo, está repleto de erros e incongruências. Mas é um esboço , um rascunho, e até o fim da história, muita coisa pode e deve mudar. Como sempre, conto com a opinião de vocês.

[LIBRA] CAP. 1 - LÍNGUAS MORTAS

Márcio Massula Jr.

- Dona Matilda, não é melhor irmos?

- Calma, Gládio. Calma. Acho que hoje ainda vamos conseguir ouvir alguém. Vamos continuar.

- Sim senhora.

Para Ramiro, na hora do almoço, quando o sol bate inclemente e as pessoas  inundam as ruas, a cidade parece irreal. Ele está há pelo menos quatro horas caminhando atrás de um emprego, de uma oportunidade, de um vislumbre, de pelo menos uma chance de sair do poço que ele mesmo cavou e que fica mais fundo a cada dia. Seus pés doem, sua cabeça lateja, o suor escorre pelo seu corpo, empapando suas roupas, descendo entre os filetes da pasta plástica que contém um punhado de currículos desatualizados e mal-impressos, que provavelmente terão o efeito contrário do esperado por ele, que, aliás, não teve nenhuma participação na elaboração dos mesmos, deixando o trabalho duro a cargo da filha mais velha, que ainda não passou dos treze anos de idade e dá os primeiros passos no mundo do processamento de textos.

- Quem?

- Mulher, casa dos trinta, aliança na mão direita, vestida casualmente.

- Quando?

- Esquece. Entrou numa loja ali na esquina.

- Certo. Quem?

Um mar de gente. Era essa a analogia que sua cabeça inflamada evocava para o turbilhão de pessoas que pipocava nas ruas, descrevendo movimentos que um dia provavelmente seriam equacionados por matemáticos e físicos, mas que agora só podiam ser explicados como isso, um mar de gente, que ia para lá e para cá, rebentando nas fachadas coloridas dos shoppings, dos centros comerciais, dos bancos, dos restaurantes e das agências de empregos.

- Homem, casa dos quarenta, aliança na mão esquerda. Carregando uma pasta transparente cheia de papéis.

- Quando?

- Agora.

Seu olhar deteve-se numa bunda particularmente redonda e vistosa, e ele quase não viu o paredão formado pelo gigante negro parado à sua frente, acompanhado por uma mulher já madura, que lhe pareceu uma apresentadora de telejornal.

O homem era, literalmente, do tamanho de um armário. Dos bem grandes. A mulher usava óculos escuros enormes, mas que caíam bem em seu rosto. Era uma mulher pequena, magra, contudo, atraente, e em tempos de vacas gordas, Ramiro certamente dispararia uma cantada chula à queima-roupa. Mas o momento não era dos melhores. E havia o gigante.

Então, a mulher falou.

- Senhor, será que podemos nos falar por uns minutos?

Mesmo com todo ranço exalado pela cidade, era possível sentir o cheiro da mulher, um aroma tênue de... rosas.

- Olha, dona, agora não vai dar não.

- Prometo que não vamos tentar vender nada, nem convertê-lo a qualquer religião. É apenas uma pesquisa.

- Que tipo de pesquisa. É pro governo?

- Digamos que tenha cunho social.

- E a opinião do senhor é muito importante para nós. - o gigante pela primeira vez abriu a boca, e disse isso com um trejeito até bonachão, o que, curiosamente, dissipou a atmosfera predatória que o envolvia.

Ramiro só começou a desconfiar quando já tinha passado da terceira cerveja. Os dois estavam bebendo refrigerantes. Os detalhes já tinham ganhado contornos esfumaçados, e até que estava bom. Os dois realmente não tinham, até aquele momento, tentado vender nada, nem convertê-lo a qualquer religião. 

Ramiro, com a garganta lubrificada, disparou a falar sobre amenidades, ao passo que os dois, vez ou outra, se entreolhavam, esboçavam sorrisos e teciam algum comentário vago sobre o que quer que estivesse sendo discutido. Quando terminou seu repertório, Ramiro passou a observar os transeuntes, enquanto pensava qual seria o número de garrafas de cerveja necessário para ultrapassar o limite das boas maneiras.

- É tudo por nossa conta, seu Ramiro. Pode ficar tranquilo, certo? - A mulher, que tinha se apresentado como Matilda, quebrou o silêncio.

- Não leva a mal não, dona. Mas é que tô achando essa pesquisa meio estranha.

- Bem, na verdade, estamos tentando quebrar o gelo, porque o assunto sobre o qual iremos falar é, um tanto... como direi? Indigesto.

Os pêlos da nuca dele se eriçaram.

- Como assim?

- Só um momento, Ramiro. Primeiro, vamos às formalidades. O Gládio aqui vai cuidar dos detalhes.

O assistente de Matilda, todo sorriso, abriu a valise que carregava consigo e tirou um formulário.

- Gládio?  - e só então Ramiro se deu conta de que ainda não sabia o nome do homem - Desculpa a curiosidade, mas é um nome bem diferente.

Gládio, que preenchia um dos formulários, respondeu, sem tirar os olhos do papel, mas, mesmo assim, parecendo simpático o suficiente.

- Na verdade é sobrenome.

- Ah, tá.

- Pronto.

Gládio olhou para Matilda e em seguida apontou sua arcada dentária imaculadamente branca para Ramiro, que já formulava a hipótese de que, se um homem daquele tamanho não estava quebrando costelas e cabeças num ringue de vale-tudo, só podia ser gay.

- Se o senhor não se importar, claro, vamos necessitar de alguns dos seus dados. Mas nenhum deles é obrigatório, entende. O senhor só vai cedê-los se assim desejar.

Quase dava vontade de rir ouvindo a mulher falar, com seu português empolado.

- Escuta dona Matilda. É... eu vou ganhar alguma coisa com isso?

Gládio se adiantou.

- Pode ser que sim.

- Mas não prometemos nada, certo? - Matilda finalizou, encarando Gládio. Parecia não ter gostado da interrupção do seu assistente.

- Profissão, seu Ramiro?

- Metalúrgico.

- Casado?

- Sim.

- Filhos?

- Dois. Quer dizer, duas.

- Formação?

Ramiro ignorou a última questão. Alguma coisa lhe afligia naquela situação toda e ele ainda não sabia muito bem o quê. Virou-se para Matilda.

- Escuta dona, não leva a mal, mas essa pesquisa é sobre o quê, afinal? Cês me pegaram na rua, me pagaram uma cerva, a gente tava aqui batendo um papo legal. Só que, quando a esmola é muita, o pobre desconfia, né não?

Ao invés de responder, Matilda esticou o braço em direção a Gládio e ficou com a mão estendida, esperando algo que ele já tirava de dentro de sua valise. Ramiro percebeu que a desenvoltura dela o assustava. Gládio depositou nas mãos dela uma pasta-arquivo parda, volumosa e meio surrada pelo manuseio constante.

- Mas o senhor é curioso mesmo, hein? - para Ramiro, o comentário soou mais como um gracejo do que como uma reprimenda, embora a linguagem corporal de Matilda não tenha feito nada para corroborar isso. - Tudo bem. Vamos ao que interessa.

Matilda coloca a pasta na mesa e pousa as duas mãos espalmadas sobre ela.

- Como eu havia dito no caminho até aqui, nossa pesquisa é opinativa. Vamos confrontar o senhor a uma situação... extrema, e, bem, está vendo esta pasta? - Ela deu um tapinha na pasta, para enfatizar a última palavra.

O garçom coloca mais uma garrafa de cerveja na mesa, em frente a Ramiro, que resmunga:

- Pô, dona, é claro que tô! Tá achando que eu sou... hã... desculpa. Desculpa.

Ela esboçou um sorriso fantasmagórico que durou mais do que Ramiro considerava suficiente.

- Tudo bem. Sem problema. Eu convivo muito bem com a minha cegueira.

Ramiro tratou logo de encher seu copo de cerveja, mais uma vez. Embora não fosse fazer muita diferença, ele evitou olhar para ela. Gládio, como sempre, parecia estar em outro planeta.

- Nessa pasta existe um dossiê completo sobre o caso da pedreira, o senhor se lembra? Passou em todos os jornais...

Ela empurrou a pasta na direção de Ramiro.

- Daquela menininha?

Ele ficou olhando para a pasta, como se ela estivesse contaminada com todo tipo de praga altamente infecciosa conhecida pelo homem.

- Sim, ela mesma.

Ele começa a abrir a pasta, mas hesita.

- Olha dona, eu não sei se quero ver isso não, hein?

- Se não quiser olhar, não precisa, seu Ramiro. Mas seria importante para o nosso trabalho.

Ramiro engole em seco e abre a primeira página. Seus batimentos cardíacos aceleram. Ele havia se preparado para ver a coisa mais horrível de sua vida, e um boletim de ocorrência não era bem o que estava esperando. Sem perceber, ele deixa escapar o ar que tinha prendido devido à tensão, o que arranca uma risadinha de Gládio e um dos outros sorrisos macabros de Matilda.

- Ela ficou em cativeiro por dez dias...

Ramiro vai examinando a pasta, lentamente, compenetrado, tentando atravessar todo o léxico jurídico daqueles documentos e, subconscientemente, evitando encontrar qualquer descrição explícita ao que acontecera com a menina.

- ...quando os animais descobriram que a polícia já tinha uma boa pista sobre o caso...

- Minha Virgem Santíssima!!!!

- ... fizeram o que presumo que o senhor esteja vendo nesse exato momento.

A foto era bem nítida e estava solta entre as folhas dos relatórios. Havia outras, mas seus olhos se detiveram nessa. Uma menina com não mais de quatro anos jazia sobre um pedaço de lona preta, ao lado de um buraco aberto na terra. Não era possível ver muito do cenário, mas, pela quantidade de vegetação rasteira, era fácil presumir que a foto foi tirada no matagal onde acharam o corpo. Havia uma cratera no que um dia tinha sido o rostinho da menina. Toda a metade direita do crânio estava afundada. Ela foi morta a marretadas. Ramiro não pôde evitar imaginar como os sequestradores tinham feito aquilo. Teriam eles segurado a criança? Ou simplesmente deram-lhe um golpe, sem que ela percebesse? “E na cabecinha dela, meu Deus do Céu!” O que teria se passado? O estômago dele manifestou-se e, num gesto de asco, ele empurrou a pasta em direção à Matilda.

- Como o senhor deve saber, os sequestradores foram pegos, e tiveram vida curta na prisão. Mas o que ninguém sabe é que o verdadeiro culpado ainda está à solta.

- Como assim?

- A foto dele está na última página.

Ramiro puxa para si a pasta e procura a foto, tomando cuidado para não abrir novamente no laudo da perícia.

- Ele era sócio do pai da criança. Foi ele quem planejou o sequestro e também foi ele quem avisou a polícia.

- Mas que linguarudo filha-da... desculpa, dona.

- Não há de quê, ele é realmente isso que você ia falar. Mas agora finalmente chegamos ao ponto, seu Ramiro.

O álcool já lhe embotava o raciocínio, e a única coisa na qual Ramiro conseguia pensar era no que faria se aquilo tivesse acontecido com uma das suas filhas.

- Se o senhor tivesse os recursos e a oportunidade de punir este homem, o que você faria? Esqueça as leis. Eu quero saber o que Ramiro, homem e pai, faria.

- Olha dona, na minha terra a gente ia pegar um infeliz desses e ia arrancar a língua dele, só pra começar. Não é assim que fazem lá nas arábia?

- Acho que a idéia é a mesma. Então era isso o que o senhor faria mesmo? Esta seria a sua decisão?

- Seria dona. Seria sim.

- Sabe, me ocorreu uma coisa interessante agora...

- O quê?

- Só uma curiosidade. A palavra decisão vem do latim de-cidere. Significa separar, cortar.

- Hã?

- É latim. Uma língua morta, seu Ramiro.

- Pô, dona! Eu sei o que é latim. Eu não tinha era entendido o que a senhora tinha falado.

- Bom, então acho que agora é minha vez de pedir desculpas.

Nesse momento, Gládio desceu da estratosfera e se reintegrou à conversa. Pediu licença a Ramiro, puxou a pasta-arquivo e guardou-a em sua valise. Depois, sem se virar para Matilda, disse:

- Vamos?

- Sim. Acho que já acabamos por aqui. Bem, era só isso, seu Ramiro. Agradecemos a sua cooperação.

Os dois se levantaram e Ramiro ficou apreensivo com a possibilidade de ter que arcar com as despesas sozinho, mas Gládio se dirigiu ao interior do bar, de carteira em punho, e Ramiro conseguiu perceber a troca de notas entre o gigante e o caixa do bar. Matilda ficou parada ao lado da mesa, como uma estátua, fitando (metaforicamente, é claro) algum ponto oculto no horizonte. Assim que Gládio se aproximou, Matilda, como se tivesse feito um movimento ensaiado, alinhou-se à ele e começou a andar, em direção ao centro da cidade. Após dar uns poucos passos, ela se virou, apontando as lentes escuras enormes em direção de Ramiro e disse.

- Obrigada, mais uma vez.

E, mais uma vez, a temperatura do sangue dele ficou abaixo de zero. Depois, quando ela estava de costas, Ramiro finalmente conseguiu divisar os contornos de uma bundinha que ainda deveria estar bem firme. E isso foi suficiente para afastar as impressões negativas que veio colecionando ao longo da tarde.


***

Ramiro não tinha comentado com a esposa a entrevista do dia anterior. Pelo menos, não aquela. Na verdade, o acontecimento já tinha sido quase que totalmente eclipsado por necessidades mais urgentes, a saber, um emprego.

Sobre a mesa da sala, havia várias páginas de jornal. Os classificados, obviamente. Havia anúncios circulados em amarelo, outros marcados com um "x" vermelho, outros cobertos de verde, e várias outras combinações possíveis entre as cores e formas, que constituíam a simbologia do desespero desse homem. Com uma caneta pendurada na orelha e alguns pincéis coloridos nas mãos, ele observava tudo da mesma maneira que um general vislumbra o mapa do terreno onde fará seu próximo ataque.

O fato de não ter que pagar aluguel era uma das poucas coisas que mantinha Ramiro a uma distância saudável (mas cada vez menor) de um infarto. Desempregado havia dois anos, ele e Cida viviam dos bicos que ambos faziam. Eles souberam administrar o dinheiro da rescisão de Ramiro e atacavam em duas frentes: Cida era confeiteira competente e nunca ficava sem trabalho. Ele tinha comprado uma Kombi usada e a princípio tinha tentado a sorte no ramo dos transportes ilegais, mas a fiscalização e as máfias foram eficazes em abreviar seu empreendimento. Por fim, ele pregou algumas folhas impressas na velha jato-de-tinta, onde podia-se ler FAZ-SE CARRETO em letras um tanto quanto coloridas, outra das obras de Vivian.  Na verdade, as coisas nem estavam tão ruins, por assim dizer. As contas estavam sob controle (homem que não tem dívida não é homem era um dos seus mantra pessoais), mas a simples perspectiva de que as tudo pudesse dar para trás de uma hora para outra era demais para ele, o que tornava quase religiosa sua obsessão por um emprego fichado.

A casa tinha sido projetada e construída por ele mesmo, o que significava que boa parte dos preceitos básicos da arquitetura tinham sido desconsiderados. A luz costumava vir por ângulos estranhos, a chuva se empoçava em locais específicos da laje e as instalações elétricas vez ou outra presenteavam os habitantes com choques na válvula do chuveiro e sabe-se lá mais onde. De qualquer maneira, isso era o que menos lhe importava. A casa própria, erguida contra todas probabilidades, funcionava como uma espécie de talismã auto-afirmativo. Ele costumava pensar que, se pôde fazer aquilo, poderia fazer qualquer coisa.

As duas gestações de Cida tinham deixado sua marca e ela não era mais a mulher esbelta que Ramiro conhecera muitos anos antes. Mas, mesmo depois desse tempo todo, ele continuava achando sua mulher muito atraente, embora nunca verbalizasse isso, nem sob tortura

- E aí, cê acha que vai conseguir alguma coisa logo?

- Vou sim, minha nega, acho que vou sim. Quem sabe hoje eu não consigo alguma coisa?

A campainha tocou.

- Deixa que eu atendo. - ela se dirigiu à porta, enxugando as mãos num pedaço de pano velho. Passados alguns minutos, ela retornou, carregando uma caixa embrulhada em papel pardo.

- Cê encomendou alguma coisa?

- Não. Porquê?

- Essa caixa tá com o seu nome.

- Pra mim? Ué?

- Bonita, né? Quem será que mandou?

Fora o nome e endereço de Ramiro, não havia mais nenhuma indicação na caixa. Ele ficou contemplando o embrulho, tentando puxar da memória quem poderia ter mandado aquilo, ou que data especial poderia ser o dia de hoje. Então lhe ocorreu que poderia ser o prêmio que Matilda disse que talvez ganhasse. Decidiu que não comentaria nada, por enquanto. Cida era uma mulher pacata, mas seu humor poderia se transformar completamente caso ela soubesse que o marido tinha bebido cerveja com uma mulher. Mesmo que a mulher estivesse acompanhada por um dos maiores homens que ele já tinha visto, mesmo que fosse só uma pesquisa (estranha, é verdade), mesmo que a imagem da criança com o rosto esmagado tenha escapado dos recônditos de sua memória como uma erupção vulcânica.

- Cê não vai abrir?

- Vou sim.

Ela trouxe uma faca de manteiga e ele começou a abrir o embrulho. Abaixo do papel de embrulho, havia o papelão em si, muito bem lacrado com fita-adesiva e sem nenhum adereço que indicasse a sua procedência. Ramiro ficou intrigado. A caixa era leve. Ele chacoalhou e percebeu que havia alguma coisa solta lá dentro. Aparentemente, seu prêmio não passaria de um brinde. O que seria? Uma agenda? 

Um conjunto de canetas? Um calculadora? A espera deixava Cida cada vez mais angustiada e ela rodeava o marido num misto de atração e reverência, como uma mosca ao redor de uma lâmpada incandescente.

Ramiro passou a faca pelo adesivo que mantinha a caixa lacrada e viu o que havia lá dentro antes que o cheiro chegasse às suas narinas.

- Minha Virgem Santíssima!!!

Ele arremessou a caixa num canto da sala, fazendo com que seu conteúdo ficasse esparramado no chão. 

Cida, ainda movida pela curiosidade, se aproximou do objeto, mas desviou a rota assim que percebeu do que se tratava, indo vomitar no quintal.

Ramiro ficou estático, tremendo. Não sabia o que fazer. Ouvia sua mulher devolver a comida e teve vontade de lhe perguntar o que acontecia, mas nenhuma palavra saiu de sua boca. Ela voltou, meio receosa, como se o que quer que estivesse dentro da caixa fosse criar vida e sair correndo atrás dela. Ambos se aproximaram, bem devagar, protegendo as narinas.

- Quê que é isso, Miro?

- Acho que é uma... língua.

P.S.: Para os curiosos, as palavras em azul marcam os trechos que estão com comentários no arquivo original.

MOTOMAN COZINHEIRO




E agora, ele montando uma câmera (e quando eu penso que não pode haver mais nenhuma bizarrice na tv japonesa).



Quando as fabricantes tradicionais de robôs industriais começam a entrar na brincadeira, é porque tem coelho nesse mato.

A propósito, eu já programei uns ancestrais desses caras.

(Roubei tudo no Engadget)

TERRA INCOGNITA 3



E a totalmente excelente revista eletrônica de ficção-científica Terra Incognita acaba de disponibilizar sua terceira edição para download gratuito.

O que você está esperando? Move!

ADSENSELESS - PARTE 5

Para variar, atrasou, mas saiu. O endereço é o de sempre: o seu, o meu, o nosso TXT.

http://txt.blogsome.com

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

ADSENSELESS - Parte 5

Márcio Massula Jr.

Macanudo notou que, ultimamente, Júnior já não demonstrava sua habitual paciência. Ou melhor, não demonstrava mais nada, uma vez que não atendia mais as ligações de Macanudo, que começou a desconfiar que insistir na rescisão de seu contrato com a Plex não tinha sido uma jogada muito inteligente.

Nas primeiras vezes, Junior simplesmente tentava dissuadir Macanudo, dizendo que tudo iria passar e que o contrato era por tempo limitado. Bastava que o primeiro esperasse. Mas, para Macanudo, esperar estava fora de cogitação. Ele estava perdendo a mulher que amava, e aquilo poderia deixar sequelas emocionais para o resto da vida.

Quando Macanudo ficou muito incisivo, Junior passou a lembrá-lo de várias cláusulas obscuras do contrato, sendo que nas últimas vezes ele chegou mesmo a perder a compostura, algo incomum numa pessoa treinada para lidar com o público.

Um dia Macanudo recebe uma ligação. É um terapeuta, contratado pela Plex. Ele quer conversar com Macanudo para checar suas condições psicológicas. Macanudo vê uma oportunidade naquilo e capricha. Não que houvesse muita necessidade. A tensão das últimas semanas devastou-o espiritualmente. As sessões, sempre na casa de Macanudo, eram compostas por longos bate-papos, onde o psicólogo se limitava a pontuar a conversa assentindo com a cabeça e tomando notas em seu netbook. Em alguns momentos, o psicólogo parecia mais interessando nos anúncios que a Faixa estava gerando do que na conversa em si.

Alguns dias depois, as sessões terminaram. Macanudo aguardava ansioso pela resposta. Descobriu que teria que passar pelas mãos de outros especialistas, que analisariam outros aspectos do seu quadro clínico.

Então veio a resposta. Ele estava apto a dar continuidade nas suas funções para a Googolplex. Aquilo era apenas tensão, e poderia ser tratada de outras maneiras. Exercícios, e, porque não, uma nova namorada.

Macanudo não concordava, mas quem dizia aquilo eram os médicos, e os médicos eram infalíveis. Só lhe restava derivar pela cidade, trocando sorrisos falsos com pessoas que não estavam mais tão interessadas no que se passava em sua cabeça.

Macanudo não aproveitou o hype. Não tirou vantagem do momento, e agora ele percebia isso vendo que o número de ocorrências que remetiam ao nome dele ou à Faixa de Anúncios caia vertiginosamente. Logo era seria passado, notícia velha, e o peso da sua decisão se tornaria muito maior. Ele falou a respeito disso com Chico, que, inexplicavelmente, não deu muita atenção ao assunto. 

Logo ele, a primeira, talvez segunda pessoa na fila dos que achincalhariam Macanudo pelo resto da vida quando ele finalmente se desse por vencido. Na verdade, a última conversa que tiveram foi sobre a Faixa. Chico queria saber se os anúncios contextualizados exibiriam conteúdo pornográfico quando Macanudo estivesse tendo relações com Ândrêa - ou com qualquer outra pessoa, embora a segunda opção estivesse muito longe de ser verdade. Macanudo ficou sem saber o que responder, mas disse ao amigo que se lembrava de algo sobre um filtro de conteúdo. Não sabia exatamente como funcionava.

Um dia ele entra em uma loja de sapatos e fica vendo alguns modelos que talvez pudessem agradar Ândrêa. Existia a chance de que um presente normal, vindo de um cara que queria voltar ao normal, fizesse com que ela reconsiderasse tudo. Ele se aproxima de uma vendedora. Ela dá um sorriso, daqueles que as pessoas costumam soltar quando estão frente à frente com celebridades em declínio vertiginoso. Os alemães têm uma palavra para isso. Schadenfreude.

- Oi.

- Olá! Precisa de ajuda, seu Macanudo?

Macanudo já tinha se acostumado com desconhecidos chamando-o pelo nome.

- Preciso sim. Quanto é aquele sapado ali?

A moça pensa em consultar o preço, mas vira-se para ele, sem saber direito o que fazer. Macanudo percebe aquilo. Acha que ela está constrangida.

- Algum problema?

- Olha, seu Macanudo... isso é alguma pegadinha?

- Pegadinha?

- É.

Macanudo não sabe o que dizer. A moça certifica-se que não há ninguém mais ouvindo os dois. Então volta à conversa.

- Isso mesmo. Seu Macanudo, eu sou nova aqui, sabe? Não queria queimar meu filme. Preciso desse emprego. Diz que não é uma pegadinha.

- Mas não é mesmo! Moça, tá tudo bem com você?

- Tá sim. É que sua testa tá mostrando o anúncio de um concorrente. E lá o preço tá menor.

Macanudo pára em frente a uma das vitrines e tenta enxergar o anúncio. Devido ao reflexo, não consegue. Tem que se contentar com a palavra da vendedora, que não teria motivos para mentir. Teria?
Ele se desculpa e sai apressado da loja. A moça, mais confiante, ainda tenta finalizar a venda. Macanudo não dá ouvidos. A situação não foi especialmente constrangedora, mas foi a gota d'água.

***

Dybbuk Júnior era o executivo que toda empresa sonhava em contratar. Possuía um currículo impecável, um sorriso radiante, quatro por cento de gordura no corpo e a total incapacidade de sentir remorso pelo que quer que fosse.

O acrônimo que definia seu cargo tinha oito letras, sendo seis delas consoantes, o que assemelhava tudo a um palavrão do leste europeu. Por isso as pessoas costumavam referir-se a ele apenas como "O Diretor".

Quando sua secretária lhe comunica pelo interfone que Macanudo Geist estava ameaçando fazer um escândalo em sua ante-sala caso não fosse atendido, ele, no mesmo tom monocórdio que usava quando pedia um café ou quando, por esporte, obliterava a auto-estima de um funcionário, pede para que ela deixe-o entrar. Enquanto ouve os passos se aproximando da porta construída com uma madeira ilegal em onze países, ele respira fundo, pressiona o topo da pirâmide nasal como polegar e o indicador e só consegue pensar em uma coisa: puta que o pariu!

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

INBOX 6K

Tinha escrito um post de mais ou menos mil palavras tentando explicar as circunstâncias pelas quais minha caixa de entrada tomou proporções, digamos, mastodônticas. Mas, como dizem por aí, uma(s) imagens vale(m) mais que mil palavras.



A saber:

1) a maioria das mensagens não-lidas tem mais de dois anos.

2) decidi que vou pelo menos passar os olhos em todas elas.

domingo, 30 de novembro de 2008

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

UMA HORA DE KUDURO

Nem vou me dar ao trabalho de explicar. Roubei no twitter da Flávia Durante.

Enjoy.



P.S.: Não se esqueça de procurar pelos vídeos. A dança é uma atração à parte.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

CELTX PORTÁTIL

Uma coisa que muitos usuários ainda não sabem a respeito do Celtx é que ele pode facilmente se converter numa aplicação portátil, ou seja, ele funciona a partir de um pendrive ou qualquer outro tipo de unidade de armazenamento externo (HDs portáteis, MP3Players, cartões SD, etc).

Embora os preços de notebooks e netbooks estejam despencando, existem muitas situações onde você vai precisar usar outro computador para continuar trabalhando nos seus projetos, e o fato de poder executar o programa, com todas as suas funcionalidades, a partir de um pendrive do tamanho de um drops, facilita muito as coisa, a meu ver.

Existem duas maneiras de se utilizar o Celtx a partir de uma unidade de armazenamento externo:

A MANEIRA MAIS FÁCIL

A maneira mais fácil ainda se ramifica em dois caminhos possíveis.

a) simplesmente copie a pasta onde o Celtx foi instalado para sua unidade de armazenamento. No Windows XP essa pasta costuma ficar em "C:\Arquivos de programas\Celtx".

No Linux (uso o Ubuntu e o SLAX), eu simplesmente descompacto o Celtx
na minha pasta Home e executo direto por lá, clicando no executável.
Esse procedimento funciona, mas apenas para um usuário. Para instalar o
Celtx *no sistema*, deixando-o disponível para todos os usuários, é necessário seguir mais alguns passos. Em versões do Ubuntu anteriores à 8.04, será necessário também baixar a biblioteca "libstdc++.so.5".

No Mac eu não faço a mínima idéia de como é o procedimento.

b) ao instalar o Celtx, o programa "pergunta" em qual local você deseja instalá-lo. Por default, no Win XP, será no "C:\Arquivos de programas\Celtx" e no Linux, caso o programa tenha sido instalado (ver item "a"), em "/usr/local/celtx". Então você pode simplesmente copiar o diretório para a unidade de armazenamento externo e clicar no executável que ele vai funcionar por lá mesmo. Mais uma vez, não faço a mínima idéia de como isso funciona no Mac, mas acredito que não haja muita diferença.

Prós:

- Você terá sempre a versão mais atual do programa.

Contras:

- O Celtx, utilizado desta maneira, não pode ser considerado um programa portátil, na acepção mais moderna do termo, uma vez que deixa rastros (como na pasta Dado de Aplicativos, no Windows) no computador onde está sendo utilizado.

A MANEIRA MAIS DIFÍCIL

Um usuário chamado Jacob Koehler fez uma versão portable do Celtx, baseada em alguma versão mais antiga do Firefox Portable. Basta que o usuário baixe o arquivo .zip, descompacte-o em sua unidade de armazenamento externo e clique no executável.

Prós:

- Essa versão do Celtx não deixa rastros no computador hospedeiro.

Contras:

- Já está bem desatualizada (em inglês parou na versão 0.996. Em português parou na 0.995). A não ser que o projeto vá ser desenvolvido do começo ao fim com essa versão, não aconselho ninguém a utilizá-la. As versões mais recentes do Celtx conseguem abrir arquivos gerados nas versões mais antigas, mas a recíproca *não* é verdadeira, ou seja, se você editar o projeto no Celtx 1.0 e depois tentar utilizá-lo novamente no 0.996, vai ter problemas.

- Faltam alguns pequenos polimentos. Em alguns arquivos de configuração e no próprio executável, por exemplo, o nome que temos é "Portable Firefox" e não "Portable Celtx". Além de ficar meio estranho, isso pode, inclusive, confundir o sistema. Tentar abrir o Portable Celtx junto com versões mais antigas (inferiores a 3.0) do Firefox pode gerar mensagens de falha, uma vez que, pelo menos no Windows, o Firefox não permite que sejam executadas duas instâncias originadas em locais diferentes do sistema.

E já que estamos falando nisso, recomendo uma passadinha nos sites PortableApps e Portable Freeware, onde há muitas outras opções de programas portáteis.

Mais informações podem ser encontradas no Wiki do Celtx.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

PARA O INFINITO E ALÉM!

Sem espaço para guardar toda a putaria que você baixou internet afora ao longo dos anos?

Então, que tal esse pendrive de 64 giga da Kingston?

Pouco?

Ok. Há também esse Flash drive de 256 GB da Samsung.

Ainda não?

Tá bom.

HD de 500 GB para notebook da Toshiba, e não se fala mais nisso!

(roubei tudo no Engadget)

ZHURA



Já ouviram falar do Zhura? (não confundir com o Zuda!)

É um formatador de roteiros online com algumas características de social network.

Embora existam outras opções, sempre achei a interface do Zhura mais polida (e nada me tira da cabeça que ele foi feito em cima do engine do Celtx).

Bom, como outros programas dessa natureza, o mote é o trabalho colaborativo. Até aí nada demais. Existem dezenas de processadores/editores de texto online, e, que eu saiba, pelo menos mais três específicos para a escrita de roteiros.

Mas o que chamou a atenção no Zhura é que agora eles tem um template para roteiros de quadrinhos, baseado no full-script americano (e, na minha opinião, melhor do que o template do Celtx).

O Zhura está disponível em duas versões: uma free e outra paga, a última com alguns extras, como importação/exportação para os formatos do Microsoft Word e do OpenOffice Writer.

Na versão free é possível importar apenas o formato .txt e exportar para .txt/.pdf (que, para mim, já tá de bom tamanho)

Para quem quiser dar uma olhada:

http://www.zhura.com

(por enquanto, só em inglês)

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

MIRROR'S EDGE

O primeiro game a mexer com sua Propriocepção.

Se liga no trailer:



(via Wired)

RSS MACHINEGUN!

Acho pouco provável que alguém assine algum feed desse blog, mas se você, ó ser iluminado, existe, não se preocupe com a provável enchente de feeds não-lidos em seu leitor.

Só estou tagueando alguns posts antigos. Puta trabalhinho, viu!

domingo, 16 de novembro de 2008

FELL EM PORTUGUÊS



Acho que comentei aqui ou no Twitter, mas a cabeça não reteu a informação e me surpreendi hoje, quando, dentro de uma livraria, vi a edição nacional de Fell, cria de Warren Ellis e Ben Templesmith. Pra vocês verem como estou desligado. O livro foi lançado em Agosto deste ano. Além disso, meu cérebro teimava em me dizer que quem lançaria seria a Devir, e não a Landscape.

Já falei da hq por aqui (e aqui), antes. Ao lado de CASANOVA, achei uma das coisas mais bacanas que a Image lançou nos últimos tempos. E sim, a proposta e o formato têm bastante a ver com isso.

Dei uma folheada rápida e a qualidade gráfica agradou. A única coisa da qual senti falta foi a seção BACK MATTER, onde Ellis costumava publicar trechos dos roteiros e discutir as idéias que o levaram a escrever tais histórias. Para muita gente, esse tipo de material é gordura, mas para mim é essencial. Claro, ninguém vai ficar sem entender as histórias por causa disso, mas custava publicar como era?

Eu tenho o material original (até a edição 6), mas estou cogitando comprar esse.

P.S.: Também vi o Sandman da Pixel. Outra da qual fiquei sabendo antes mas que não registrei na memória. Achei esquisito pra caralho.

sábado, 15 de novembro de 2008

MANGÁ MAN

falei do Alexander Besher antes, certo tempo atrás.

Agora há pouco descobri que seu mais recente trabalho, MANGÁ MAN, está disponível para leitura online. E no 0800.

O trabalho, na verdade, foi concebido para leitura em celulares, e contém partes em outras mídias. Além disso, a idéia que o autor teve para levar os leitores ao material foi muito boa.

Lerei, com prazer.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

2012

Mais uma do "garoto-cataclismo" Roland Emmerich. Me interessa mais pelo simbolismo do que pelo enredo em si. Mas o teaser fico massa, devo dizer.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

WAGNER E BETHOVEN

Nem vou me dar ao trabalho de comentar. Tome aí um Ctrl+C, Ctrl+V num post do Marcelo Träsel lá n'O DE SEMPRE NUNCA.

Wagner e Beethoven é uma série de histórias em quadrinhos que parte do subtítulo “o cânone ocidental é pequeno demais para nós dois, cara!”, para mostrar a vida dos dois compositores de sinfonia dividindo um apartamento em São Paulo e estudando Música na ECA/USP. Ironia fina.

(copiei o texto, mas, mudarei a imagem)


E veja aí essa outra tirinha. Se não rir é mulher do padre (com quaisquer conotações que isso possa ter. Ou que sempre teve, mas nós, lá do baixo de nossa infância, nunca entendemos).

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

COPA DE LITERATURA BRASILEIRA - JOGO 13

Sem mais delongas:

Primeiro, leiam a partida, hã... apitada pelo André Sant'Anna.

Depois leiam o comentários nº 6.

Será que fui só eu que achei *"do caralho"*?

(e só agora me dei conta do meu próprio comentário. Espero que ninguém se lembre da antiga numerologia do jogo do bicho, hihihi...).

sábado, 8 de novembro de 2008

ONIPRESENÇA

Atulizei a caixinha "Onipresença" (lado esquerdo da tela, lá em baixo) com mais algumas das redes sociais onde costumo perder meu tempo. Apaguei umas outras e consertei uns links quebrados. Não costumo freqeentar a grande maioria delas e só mantenho esses perfis porque existe um ou outro recurso que me interessa. Também tenho evitado convites para entrar em novas redes sociais ou ainda reativar contas em serviços que já experimentei.

A palavra é: FOCO!

De qualquer maneira, tamos aí. Me add?

PIDA



A gente vai ficando velho e começa a achar graça em cada bobagem...

E, antes que me perguntem, o PIDA é isso aqui.

sábado, 1 de novembro de 2008

CHINA CHANNEL

Add-on para o Firefox que permite ao usuário surfar pela web como se estivesse na China, mesmo não estando na China!

(eu não instalei, antes que me perguntem).

SOCIAL DNS

Já falei que tô no Social DNS?

go://massula

go://txt

Para acessar os dois últimos links, é necessário instalar um plugin no browser (só para Firefox ou IE, por enquanto).

Go!

MIDRAXE

Acabei de exumar outro conto lá no TXT.

Foi o primeiro que publiquei no MIDRAXE, e que, obviamente, deu nome ao ezine. Com exceção de alguns pequenos retoques, essa versão não difere da de 2004.

Interessante lembrar que, naquela época, eu só escrevia em fonte Courrier New, que hoje em dia acho horrorosa.

MIDRAXE

Era mais uma daquelas tardes monótonas de terça. Meu aparelho de ar-condicionado urrava pedindo clemência, mas o calor senegalesco tornava-me um verdadeiro tirano com as utilidades do lar.

Embora, claro, eu não estivesse em meu lar.

Passava a maior parte do dia (e às vezes a noite também) ali, mas aquele escritório, de maneira nenhuma, poderia ser chamado de lar.

Ou poderia?

Meu escritório nunca foi muito agitado. Sempre tive uma clientela fixa, que compensava seu tamanho reduzido com uma grande fidelidade.

E pagava bem.

Eu conhecia meus clientes pelos nomes. Não fazia a mínima idéia sobre a idoneidade desses nomes, e nunca tive muito interesse em investigá-los. Outros do meu ramo costumam fazer isso, mas eu não. O simples fato das pessoas perderem alguns minutos elaborando um nome falso me deixava feliz. Queria dizer que elas achavam que eu merecia um pouco de respeito. Só um pouco, acho.

Então, alguém bateu à porta, interrompendo minhas divagações.

Eu detesto ser interrompido.

Mesmo assim, fui atender.

*****

Sim, era verdade.

*****

Ele era velho. Bem velho. Por volta dos 70 e poucos. Eu nunca gostei de velhos, e a idéia de necessitar da boa-vontade de alguém para limpar a bunda me assombrava. Com sorte, vou antes dos 50. Ficou ali, parado, me encarando, tentando esboçar um sorriso, ser simpático. Tinha batido na porta certa?

- Pois não?

- Senhor Romano, presumo. – disse, estendendo a mão enrugada pra mim. Não pude deixar de notar o anel. Um grande anel prateado com um emblema que não consegui enxergar direito naquele momento. Devia ser um maçom ou algo assim.

- Eu mesmo. Como me encontrou? – não retribuí a cortesia. Ainda não era hora. Tinha que interpretar meu papel.

- O senhor me foi indicado. Por esta pessoa. O senhor deve saber de quem se trata. – com a mesma mão que estivera estendida a mim poucos segundos antes, ele pegou um pedaço de papel no bolso do terno. Um cartão. Muito bem cuidado. Caríssimo. Eu teria que trabalhar muito pra ter um daqueles. Não gostei do sarcasmo. Mas dinheiro é dinheiro, sabem como é. E eu conhecia o nome. Sendo verdadeiro ou não.

- Conheço sim. Tenha a bondade. – saí do caminho, deixando o velho entrar em minha sala.
Modéstia à parte, eu cuidava bem do meu ambiente de trabalho. Uma sala simples, discreta, num prédio conhecido, mas não muito frequentado. Agora era minha vez de fingir simpatia. Estendi a mão.

- Peço que o senhor me desculpe pelos modos pouco amistosos, mas sabe como é. Nesse ramo nós fazemos muitas inimizades. Temos que nos precaver. Sente-se, por favor.
Ele sentou-se, ereto, na cadeira semi-nova que eu mantinha em frente à minha mesa. Quase todos os meus negócios eram tratados fora do escritório. Na verdade eu mantinha minha “agência” mais por capricho do que por necessidade.

- O senhor nos foi muito bem recomendado, senhor Romano, e...

- Pode me chamar apenas de Romano, por favor. – sempre interrompa os clientes. Isso lhes tira a sensação de poder. Intimida. Além de fazer você parecer mais esperto. No fundo eles gostam disso. Pensam que será um dinheiro bem investido. O que, no meu caso, não passa da mais pura e simples verdade.

- Ah, sim. Pois não, Romano. Como ia dizendo, o senho..., aham...desculpe,  foi muito bem recomendado. Por isso mesmo vou direto ao ponto.

- Que seria?

- Diga-me, o senhor costuma acessar muito a internet?

- Ocasionalmente. Uso para fazer pesquisas e me considero entendido, mas nunca fui um entusiasta. Sou um dos que trabalha à moda antiga.

- Claro, claro. Como eu. – riu, talvez imaginando que eu tivesse entendido a piadinha implícita em sua observação. Eu entendi. Mas fingi não entender. Não gosto de velhos, já disse.

- Bem, mesmo sendo um usuário eventual é provável que já tenha ouvido falar disso aqui. – e sacou da sua valise um livreto, cuidadosamente encadernado, com pouco mais de 40 páginas. A capa trazia impressa, em letras garrafais, apenas uma exclamação: MUDE!

Folheei desinteressadamente o documento. Pelos tópicos, presumi que se tratasse de algo na linha de auto-ajuda. Nunca gostei desse tipo de literatura. Pelo menos não publicamente. Coloquei a apostila sobre minha mesa, na esperança de que ele me desse ou esquecesse ali. Fiquei curioso pra saber o que tinha dentro.

- Conhece?

- É a primeira vez que vejo. O que é? Um livro de auto-ajuda?

- Sim, poderíamos dizer que sim. Esse documento tem sido distribuído pela internet gratuitamente há cerca de cinco semanas. O site original foi tirado do ar, mas algumas centenas de pessoas já tinham copiado e lido, e surgiram várias páginas disponibilizando esse arquivo. O resto foi efeito dominó. Mais pessoas liam, copiavam e disponibilizavam, o que tornou virtualmente (e esboçou um pequeno sorriso imaginando que talvez eu atentasse para esse trocadilho horrendo) impossível a eliminação disso in loco. Ontem saiu o segundo capítulo. Ao que parece, serão cinco.

- E?

- Já tivemos notícias de que o texto foi traduzido para o inglês, espanhol, alemão, italiano, francês, chinês e árabe. E incrivelmente, parecem não existir incorreções ou modificações sobre o original. Ninguém ousou alterar seu conteúdo.

*****

Eu só queria saber onde estava me metendo. Ele não suava, não tremia, não aparentava medo ou intimidação alguma. Só me olhava, com aqueles grandes olhos negros.

*****

- Mas o que tem esse texto de tão especial?

- O senhor deve ser um homem extremamente reservado, estou certo? Não deve gostar muito de televisão, não é?

- Não gosto mesmo. Mas leio meu jornal todas as manhãs, se quer saber. – velho irritante.

- Já ouviu falar dos Renascidos? Da Igreja dos Recém-desvelados? Desde que esse manifesto foi publicado, catalogamos aproximadamente 86 novas religiões e seitas. Ah!, me esqueci dos Acólitos do Pdf. Isso pra não falar das micro-repúblicas...

- E esse manifesto tem algo a ver com essa história toda, estou certo?

- Certíssimo! – ele disse. Eu não podia deixar de observar aquele imenso anel em seu dedo anular esquerdo. Consegui entender o que era o tal emblema. Uma cruz, sobreposta a outro símbolo que não consegui identificar. Evitei ficar olhando muito.

- Tá, mas onde eu entro nessa história toda?

- É muito simples, queremos que você encontre o autor desse texto.

*****

O velho tinha me dito para não ler. Mas eu li. Merda.

*****

Ao contrário dos meus colegas de profissão, minha experiência tinha parcas raízes acadêmicas, contrastando com o empirismo selvagem presente na esmagadora maioria dos meus conhecidos. Não cheguei a me formar, mas não escondo que alimentei a esperança de ver o meu nome estampado na capa de um livro. Eu era jovem, e tudo o que veio depois em minha vida, inclusive a “guinada” na escolha da minha futura carreira, só veio a comprovar o quão errado estava. De qualquer forma, eu trouxe comigo coisas boas daquele período. O hábito de pesquisar, por exemplo.

O autor do texto assinava como Y.H. E completava “um homem como todos”. Seu estilo era leve, simples. Nada de palavras rebuscadas nem de arabescos verbais. Nenhuma novidade, pra ser sincero. Nada que os livros de auto-ajuda já não viessem borrifando nas mentes das pessoas durante anos e anos. O que notei, que talvez fizesse a diferença, era a disposição dessas informações. Tudo parecia fácil e possível. O texto era quase uma obra de engenharia. Todas as palavras e idéias pareciam ter sido calculadas para surtir o efeito máximo. A mensagem era clara, objetiva, direta. E muito eficaz, pelo visto. Começou no país, se alastrando pelo mundo logo em seguida. O opúsculo, apenas um volume de uma obra maior, fora responsável pela mudança na vida de pessoas por todo o planeta. Executivos bem sucedidos simplesmente desligavam-se de suas empresas em busca de um maior conhecimento de “si próprios”. Programadores abandonavam seus códigos em troca do cultivo de alimentos hidropônicos em pequenos pedaços de terra nos rincões do país. Generais renunciavam à pátria e à farda para aproveitarem suas tardes compondo haiku. Operários deixavam as máquinas de lado e se dedicavam aos animais sem dono. A sociedade capitalista estava a três passos do colapso, embora ainda não tivesse se dado conta disso.

Funcionava mais rápido com alguns. Com outros, a transformação ocorria paulatinamente, mas ninguém ficava indiferente ao seu conteúdo. Ninguém.

Contudo, chegava a ser engraçado. A mídia e os governos encaravam a situação como um surto coletivo de excentricidade. Nada mais.

A questão agora era: como encontrar um homem sem rosto e sem nome? Isso, partindo do princípio que ele realmente existisse. Uma dupla de iniciais era algo muito vago para me basear, e em tempos de coletivos artísticos, a possibilidade de que aquilo pudesse ter sido escrito por mais de uma pessoa era muito grande. De qualquer maneira, alguém escreveu, e era meu trabalho encontrá-lo.

Embora a internet não fosse o lugar (se é que fosse um lugar) mais apropriado para encontrar informações precisas sobre algo, decidi começar por lá. Questão de comodidade. Cada vez que eu apontava meu buscador para alguma das combinações possíveis das palavras MUDE, Y.H., auto-ajuda e felicidade, o número de ocorrências aumentava. Exponencialmente. Na última vez que olhei, estava ultrapassando a casa dos milhões. Confesso que fiquei surpreso (medo seria a palavra certa, mas eu não diria assim de jeito nenhum. Tenho uma reputação a zelar, sabem como é). Ficava cada vez mais difícil separar o joio do trigo. Tudo o que estava acontecendo era um típico fenômeno do século 21. 

Informação espalhada à revelia, com penetração maciça. Mas aquela informação era diferente. Era capaz de quebrar convicções sedimentadas durante anos como se fossem gravetos.

*****

Não havia medo em seus olhos. Não havia rancor. Não havia desespero. Não havia confusão.

Só havia - e sei que parece engraçado dito assim – amor.

*****

A dificuldade em encontrar alguém é diretamente proporcional ao preço do serviço. Eu não contava com todo esse trabalho na hora de fazer meu orçamento. Obviamente, o velho teria que reavaliar os meus dividendos.

A procura pelo sujeito, depois de algumas horas em frente ao computador, mostrou-se infrutífera. Decidi que talvez fosse melhor começar devagar, comendo as beiradas, como diriam na minha terra. No país já havia dezenas de seitas, igrejas, grupos de estudos, fã-clubes e quejandos, fundadas em reverência a Y.H. A coisa ia do anarquismo homeopático da Igreja do Não-Trabalho - que pregava o ócio construtivo, através do uso extensivo de conexão, assim como provisões e demais recursos pagos pelos empregadores, na busca da iluminação pessoal - ao non-sense total dos Pequenos Schopenhauers. 

Nunca entendi quem realmente queria dominar o mundo. Separei alguns que me pareceram mais objetivos e iniciei minha busca.

*****

No seu pescoço há uma tatuagem de uma cobra mordendo o próprio rabo. Já vi isso em algum lugar, embora o significado exato não me ocorra agora.

*****

Infrutíferas, todas as tentativas. Sempre que perguntava sobre o autor daquelas palavras, eu via o abanar de apostilas e encadernações mal feitas do primeiro capítulo de MUDE! “Ele está aqui”, diziam alguns.
Passei duas semanas freqüentando os cultos escalafobéticos da Panspermia Metempsicótica para descobrir que o grande segredo revelado apenas aos iniciados – e nem precisei me tornar um deles - era a teoria de que todos somos esporos alienígenas que chegaram à Terra em um meteoro e desde então entraram num ciclo infinito de reencarnações que só será quebrado com a publicação do quinto volume de MUDE! Sem falar na tortuosa correspondência eletrônica que mantive com o fundador (e único membro, desconfio) do Reverso da Fortuna, um grupo de estudos que afirma que o real objetivo do livro era que as pessoas não mudassem. Enfim, loucura para todos os gostos.

Algo que notei em minhas investigações era a dissolução da idéia original, conforme o tempo ia passando. (Mas não é assim com todas as idéias?). No princípio todas as pessoas pareciam ter entendido a mensagem do livro de maneira relativamente parecida. Mas foi questão de semanas até que começassem a surgir dissidências e interpretações menos ortodoxas. Nem preciso dizer que isso só dificultou minha vida.

Meses se passaram sem que eu tivesse conseguido arranhar ao menos a superfície de toda aquela história. As pessoas, as lendas, os fatos, os boatos, tudo se multiplicava numa velocidade assustadora. Era como nadar em areia movediça. Sem saber nadar. Gastei uma pequena fortuna viajando a todos os cantos do país à cata de alguma informação, nome, dica ou o que fosse. Felizmente, meus empregadores eram pessoas de recursos, muitos recursos. Eu continuava minha busca movido pela inércia. Não fazia sentido. De qualquer maneira, o dinheiro continuava entrando em minha conta.
Em todo esse tempo, eu já havia me tornado um verdadeiro especialista no assunto. Cadastrei-me em várias listas de discussão, afiliei-me a várias congregações que aceitavam inscrições por correspondência, frequentei reuniões e cheguei mesmo a cogitar a criação de um site, blog (depois de todo esse tempo fiquei íntimo o suficiente da internet para me permitir tal façanha) ou algo semelhante sobre o assunto. Acho que isso criou algum tipo de imunidade à palavra. Quanto mais o tempo passava, mais ridícula eu achava aquela situação.

Até que um dia, a sorte sorriu pra mim.

*****

Ou não, dependendo do ponto de vista.

*****

Estava me barbeando quando o telefone tocou. Poucas pessoas tinham o meu número e eu não costumava receber ligações sociais. Atendi, a contragosto.

- Alô?

- Romano?

- Quem fala?

- Sou eu. Y.H. Aquele a quem procura.

Titubeei, não escondo. Meu cérebro funcionava à toda na tentativa de optar entre a descrença ou o crédito àquela identificação.

- Que história é essa? Não sei do que está falando.

- Sabe sim. Sabia que você é um péssimo mentiroso? A entonação em sua voz, o tempo que demorou para responder. A pausa entre as palavras...

O número já estava no meu identificador de chamadas. Era da cidade. Além de mim, apenas meu(s) empregador(es) sabia(m) do trabalho. Não poderia ser uma piada ou armadilha. Ou poderia? Paranóia é um pré-requisito nesse ramo.

- Acredite no que digo. Sei da história toda, do velho com anel esquisito e da sua busca fracassada. Creio que você deva ter um identificador de chamadas aí. Mas não se preocupe em encontrar o número. 
Vou lhe dar meu endereço atual. Fica mais fácil e assim acabamos com essa história de uma vez por todas. Ou, pelo menos, dessa vez.

Era uma voz melódica. De alguma maneira fazia com que eu me sentisse confuso. Tenso. Péssimo pra minha profissão.

Anotei o endereço. Era uma chácara na região metropolitana da cidade. Eu já conhecia o lugar. Um amigo também tinha uma chácara ali.

*****

Nunca me faltou tanta convicção quanto agora. E ele ali, apontando para as costelas...

*****

Marcamos para o outro dia, na hora do almoço.

Cheguei na chácara duas horas antes. Poderia, e provavelmente seria, uma armadilha. Porque, eu não saberia dizer. Da mesma maneira como eu não conseguiria responder com certeza porque eu estava ali. 

Era tudo muito óbvio, muito clichê, se querem saber. Parei o carro bem antes e segui os últimos quinhentos metros a pé. Estava me arriscando ao deixar o carro assim tão longe, mas toda aquela vegetação ajudaria no caso de uma fuga. Minha maior preocupação era toda aquela poeira em minha roupa. Fui beirando a estradinha de terra que levava até a casa. Quando cheguei ao portão, avaliei o terreno. Nenhum carro, nenhum cachorro, ninguém. Entrei devagar. Tirei a arma do coldre e deixei-a presa na minha cintura, na parte de trás da calça. O silêncio ali chegava a ser lúgubre. A casa em si era humilde. Nova, mas humilde. Uma varanda com uma rede pendurada, uma mesa e algumas cadeiras de jardim que há muito não deveriam ser usadas. Não havia rastros recentes de carros ou motos. Se houvesse alguém ali, teria que ter vindo a pé. Como eu. Uma piscina mal-feita ao lado da casa aparentava não ter sido limpa nos últimos meses. Mais próximo do lugar, eu reparei, a própria casa não recebia qualquer tipo de manutenção há tempos. Folhas secas criavam um tapete natural em frente à porta principal. O termo “natureza morta” me veio à mente. Contornei a casa em busca de uma entrada alternativa. Encontrei.

*****

Agora eu começava a compreender tudo. Talvez, a crença no livro - e apenas nele - fosse apenas um mecanismo de auto-defesa, de proteção. Num nível subconsciente, as pessoas deviam perceber a verdade. Mas descartavam-na. Era melhor. E não fazia diferença.

*****

O som das teclas era frenético. Ele digitava sem olhar para o teclado, era como se tivesse feito aquilo a vida toda. Só parava para ajustar os óculos que insistiam em escorregar para a ponta do nariz. Estava curvado sobre o velho monitor. Havia manchas de suor em sua camiseta desbotada, e seus pés estavam cruzados embaixo da cadeira. Relaxado. Concentrado. Não tinha percebido minha presença. E parecia inofensivo.

Entrei no pequeno quarto, com a arma em punho. Ele me viu, e não pareceu nem um pouco surpreso. Com certeza, esse não era meu estado de espírito.

- Ah! Você veio. Um pouco adiantado, não? – disse, enquanto consultava seu relógio de pulso barato.

- Só uma pergunta: você sabe quem eu sou? – a verdade é que não consegui pensar em nada melhor pra dizer.

- Espero que seja uma pergunta retórica – disse, dando uma piscadela. - Claro que sei quem é você. Eu te liguei, não liguei?

- Então, pela ordem natural das coisas, essa conversa não deveria estar acontecendo, não é verdade? Você deveria estar fugindo ou se escondendo.

- Hmmmm...faz sentido, faz sentido. Mas já devo lhe avisar (algo que seus empregadores não devem ter feito, certamente) que a ordem natural das coisas não seria o termo mais correto a se aplicar aqui.

- E por quê?

- Veja Romano... – ele se moveu na cadeira, cruzando as pernas como quem vai dar uma entrevista. Um pequeno movimento com minha arma foi claro o suficiente para ele entender que eu não gostava dos seus movimentos. Ele levantou as mãos, pedindo calma. Achei seguro continuar mantendo distância. - ...você sabe quem realmente está pagando o seu salário?

- Espero que seja uma pergunta retórica – eu disse, dando uma piscadela.

- Touché! Perguntas não são algo muito bem-vindo no seu ramo, acredito. De qualquer maneira, vou continuar meu raciocínio. A pessoa que lhe procurou usava um anel como esse? – e mostrou a mão esquerda, com um anel semelhante ao do velho.

- Tinha, e daí?

- Sabe o que significa esse símbolo?

- Não, e não quero saber. Nem sei o que estou fazendo aqui, conversando com você.

- Calma, calma! – disse, ainda com as mãos para cima.  – Precisamos conversar mais um pouco. Depois, você faz o que tem que fazer. Não vou fugir, me entreguei, lembra? Sei do meu destino. Mas talvez você não saiba do seu...

- ...

- Deixe eu lhe contar uma história. Tudo começou há muito tempo atrás. Sabe o que é midraxe?

- ...não..

- Esse termo – que acho maravilhoso, se me permite fazer esse aparte – vem do hebraico. É o nome que os teólogos deram a um artifício narrativo utilizado há muito tempo. Eles dizem que é uma narração de fundo histórico, ornamentada pelo autor sagrado para servir à instrução teológica. O autor conta o fato de modo a destacar o valor ou o significado religioso deste fato. Sua intenção não é a de um cronista, mas a de um catequista ou teólogo. Vi essa definição num site um dia desses. Embora seja deliciosa em seu cinismo, o termo também pode ser entendido como uma história baseada num modelo anterior. Um eufemismo para plágio, se assim preferir.

- E?

- Histórias superpostas sobre camadas de outras histórias, por sua vez superpostas sobre camadas de outras histórias. Qual terá sido a primeira mensagem? Qual terá sido a primeira informação? Isso não te lembra nada?

- Não.

O desgraçado era bom. Eu estava prestando atenção. Em cada palavra.

- Eu fui um garoto normal. Ao contrário de tudo o que disseram até hoje. Curioso, mas normal. A coisa toda descambou mesmo quando resolvi fazer uma viagem. Uma longa viagem. Está me acompanhando?

Preferi não responder, mas minha expressão era óbvia.

- Então, digamos que nessa viagem eu tenha aprendido alguns...truques. Mas o que eu considero ter sido realmente valioso foi um princípio. Um ideal. 

- Que seria?

- A implosão, embora esse termo não existisse na época, de um conceito. Simples.

- Que conceito?

- Autoridade.

- Como assim?

- Autoridade. Nunca gostei dela. Ninguém precisa disso.

- Amigo, pouco me importa o que você acha ou deixou de achar sobre esse assunto. Você sabe muito bem o que eu vim fazer aqui, não sabe?

- Sei. Claro. Mas o assunto te interessa sim. Se não você já teria puxado o gatilho. Deixe-me terminar minha história, está bem? Depois você faz o que veio fazer e nós dois ficamos felizes. Como eu estava dizendo antes de você me interromper, voltei do Oriente disposto a realizar aquilo que antes só passava pela minha cabeça. Banir totalmente o conceito. E que laboratório melhor para testar isso do que um território sob o julgo de um império estrangeiro? Mas aí a coisa toda tomou proporções inesperadas, e a mensagem se deturpou. É por isso que estou fazendo esse livro. Já tive muito tempo para estudar PNL, memética, e cá pra nós, a palavra impressa tende a se conservar mais do que a falada. Escreveram coisas que disseram que eu disse, e eu não disse. Agora eu mesmo digo o que quero através do que escrevo. Sem intermediários, sem atravessadores. Na verdade houve certa negligência da minha parte. Se eu tivesse me empenhado mais, as coisas não teriam tomado esse rumo, teria sido apenas um fenômeno localizado, de curta duração, uma curiosidade histórica, apenas isso. Só que fiquei curioso pra ver onde ia dar aquilo tudo, e simplesmente me afastei. Deixei rolar, como dizem.

- Mas se deturpou como? – eu já tinha me perdido na metade da sua história e não consegui pensar em nada melhor para dizer.

- Saulo.

- Quem?

- Saulo. Eles acreditaram que tinham me matado, mas eu, como já disse antes, dominava alguns truques 
e consegui enganá-los. Algum tempo depois, Saulo me viu – ele, ao contrário do que a história diz, presenciou minha suposta morte – e achou tratar-se de um milagre. E a confusão só aumentou quando ele conseguiu localizar meus antigos seguidores. Converteu-se à doutrina supostamente fundada por mim. Mudou de nome, inclusive, e tornou-se um dos maiores divulgadores dos meus “ideais”. Tentei abrir seus olhos e atentá-lo para o engano que cometia, mas já era tarde demais. Estava cego pela história que sua própria mente criou. Ele me tomou pelo demônio e fundou uma ordem, só para me caçar.

- Ordem?

- Sim. Hoje em dia não passa de uma agremiação de idosos excêntricos e abastados tentando conquistar algum tipo de respeito através de conhecimentos ocultos. – fez um gesto caricato, imitando um monstro, um bicho-papão. - Mas alguns ainda acreditam. E tem os registros. Costumam usar indefectíveis anéis de prata. Viu algum nos últimos dias?

- Então o velho...

- Sim, o velho. E eu também. “Mantenha seus inimigos por perto”. Conseguiram colocar as mãos em mim uma vez. Na idade média. Claro, consegui escapar. Do meu jeito. O engraçado é que, contei esse episódio a um escritor certa vez, quando estávamos presos em um gulag, assim, como se fosse uma piada, e isso acabou virando o trecho mais famoso de um dos seus livros mais famosos. Quase uma anedota.

Não entendi. Talvez ele tenha percebido. Talvez não. Fantasia demais. Ou, talvez não. O que poderia acontecer comigo se eu perguntasse?

- Peraí, se entendi bem, você afirma ser bem mais velho do que aparenta, certo?

- Certo.

- E estaria fugindo dessa ordem há quanto tempo, exatamente?

- Há longos dois mil anos...

- O quê? Tudo bem, você é escritor, mas não acha que está forçando a barra não?

- Bem, acreditar é um problema único e exclusivo seu. A palavra é: metempsicose. Também gosto dela. Sabe o que é?

- Você vai me contar de qualquer jeito, não é?

- É.

- Então vamos lá. Eu tenho tempo e sou curioso. E você realmente não vai me dar trabalho.

- Metempsicose, Romano, a perpetuação da alma em corpos diferentes. Ou melhor, a conservação da alma.

- ???

- Minha...alma...vem pulando de corpos todos esses anos...sim, é verdade. Existem complicadores. Nós conseguimos vagas, mas temos que nos contentar com o corpo que recebemos. Acredite, é difícil fazer qualquer tipo de protesto enquanto se está sendo polinizado por uma abelha ou perseguido por uma matilha de lobos. Antigamente era mais fácil, eu dominava algumas técnicas que prolongavam a...hmmm...vida útil de um corpo. Infelizmente a memória torna-se traiçoeira com a idade e temo que se tentasse algo do tipo hoje os efeitos seriam bem diferentes. Melhor ser uma roseira do que não ser nada. Mas até que dei sorte. No cômputo geral, consegui habitar um corpo humano um número satisfatório de vezes.

- ...

- O que significa que, mesmo crivando meu corpo com as balas dessa arma, dentro em breve você poderá ter notícias minhas. Ou não. Sei lá...estou cansado, de saco cheio. Preciso, sair de cena, de novas férias. Por isso te chamei.

- Muito interessante essa história toda, mas chega de conversa. Acho melhor você fazer suas preces, se é que me entende.

- Rá! Essa foi boa! Um minuto, sim?

Como se eu não estivesse ali, prestes a matá-lo, ele se vira e faz algo que me parece ser salvar o arquivo no qual estava trabalhando. Continua teclando mais alguns momentos e então me dou conta de que posso ter caído numa armadilha, de que ele está me confundindo para que eu seja surpreendido aqui. Mesmo com meu tiro explodindo o monitor em sua face, ele, ainda assim, parece não se surpreender. Lentamente coloca as mãos para o alto. Tinha uma cara de desapontamento, mas não a de alguém prestes a morrer. Parecia mais uma criança que foi obrigada a interromper uma brincadeira porque estava na hora de tomar banho.

- Certo, certo. Vamos lá então. Você podia pelo menos ter esperado eu terminar, né?

- Um último desejo?

Eu era um profissional, e não podia deixar a peteca cair. Tinha que mostrar que estava no controle, que ainda era capaz de uma simples ironia, que não ia me deixar levar pela conversa de um maluco. Mesmo prestes a apagar a única testemunha daquele breve momento de credulidade pelo qual passei.

- Sim. Os disquetes contendo as minhas anotações para os outros fascículos estão ali. Cuide bem deles.
Minhas mãos tremiam e eu suava como um porco. Ele girou a cadeira, ficando de frente para mim. Apontava o indicador esquerdo para as costelas, logo abaixo do coração. Pediu que eu atirasse ali. Força do hábito, disse. Dei um tiro no meio da testa. Só pra garantir.

Eu precisava sair dali rápido, mas minhas pernas tinham virado geléia, e só recobraram a consistência original quando eu olhei para os tais disquetes. Uma pilha deles, uns cinco ou seis, estavam numa outra mesa, repleta de livros e revistas, no canto oposto do aposento. Coloquei-os em meu bolso e parti. Queria dar uma olhada neles. Que mal poderia haver?

*****

Já faz dois dias que não durmo. Comi apenas o suficiente para não parar. Não posso sair. Tenho muito trabalho. Li todos os textos dele, várias vezes. Como pude ignorar aquilo? Como pude ficar alheio à Mensagem? Tremo só de pensar nas possibilidades, no que ele poderia ter feito. Nas várias faces do mundo que poderiam ter sido esculpidas por esse homem. As pessoas têm que saber. Preparei os textos e estou enviando a Palavra agora, ao maior número possível de pessoas. Fico me perguntando por que eu? Por que fui escolhido? Por que tive essa honra? E a resposta é sempre a mesma: eu fui escolhido porque estava lá. Só isso. O velho está atrás de mim e vai me encontrar a qualquer momento. Tenho muito trabalho. Tenho que espalhar as Boas Novas.

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MARCIO MASSULA JR. tem grande apreço por palavras estranhas das quais ele geralmente desconhece o significado. Mas isso não importa. O que importa é que os outros não saibam.