Tenho um grande interesse sobre a mecânica que rege feitura das histórias, sejam elas escritas, encenadas ou filmadas, e por isso mesmo sou leitor voraz de tudo quanto é manual que se propões a “ensinar” o lance. Não escondo que durante certa época acreditava piamente na eficácia dessas maravilhas, e se hoje costumo ser mais cético quanto a determinados medalhões e técnicas, ainda me divirto sabendo o que as pessoas têm a dizer sobre o assunto. E por isso costumo me espantar quando vejo em alguns manuais/cursos/palestras/escolas, frases do tipo “aqui não damos receitas, blá, blá, blá...”.
Acho que se alguém se dispôs a reunir sua experiência pessoal numa mídia qualquer e está disposto a oferecer isso às pessoas, está sim dando uma receita. O que acontece, na verdade, é que existem receitas que mandam você colocar 3,278 colheres de açúcar, e outras que dizem apenas “açúcar a gosto”. Mas no frigir dos ovos é sempre a mesma coisa (estou gastronômico hoje, não?). Claro, tem gente que tem a consciência de dizer É ASSIM QUE FAÇO, invés de É ASSIM QUE VOCÊ DEVERIA FAZER, e tendo a simpatizar com o primeiro grupo, mas não deixo de querer saber o que o segundo diz. Nem que seja pra refutar tudo imediatamente.
ADAPTAÇÃO ilustra bem isso. Um filme que contém um bom número de referências cifradas que fazem muito mais sentido pra quem tem alguma familiaridade com o mundo dos roteiristas gringos e que, pelo menos entre os meus conhecidos, agradou apenas a quem também tem algum tipo de relacionamento com roteiros cinematográficos (mas, vá lá, não conheço tanta gente assim). A história já nasceu esquisita, uma vez que o roteiro é assinado por Charlie Kaufman e por seu irmão imaginário, Donald. O filme, que seria uma adaptação do livro A HISTÓRIA DO LADRÃO DE ORQUÍDEAS, acabou se transformando na história da adaptação, e Kaufman fez uma mistureba do cacete entre fato e ficção, da qual gostei muito, diga-se de passagem. Charlie é um roteirista do tipo artístico, e Donald, um cara extrovertido que agrada todo mundo, antítese do irmão, a certa altura também decide se aventurar pelo mundo dos roteiros, fazendo, mais uma vez, tudo ao contrário do irmão. Comentar mais seria injustiça com quem não viu a parada e não resiste a um spoiler, mas quem viu já entendeu onde quero chegar, né?
Né?
Né?
Nenhum comentário:
Postar um comentário